quarta-feira, 18 de novembro de 2015

A mulher que me tornei.

Tenho duas lembranças da minha adolescência que me marcam muito, a primeira é de quando eu tinha 16 anos e consegui meu primeiro emprego, ganhava um salário de 170 reais, mas ganhei um aumento e passei a ganhar 190!
Nessa época eu tive um namoradinho na porta da escola, que hoje é meu grande amigo, ele já tinha terminado o ensino médio e um dia eu perguntei se ele não queria fazer nada, um curso, uma faculdade, procurar um trabalho, sei lá, por que na minha cabeça sempre tive muito claro o que queria cursar e fazer da vida. Ele não sabia direto, pensava em fazer um curso de desenho mas não passava muita segurança não, então eu resolvi terminar pq "não queria um cara que não ia fazer nada da vida", eu estava cobrando isso de um cara de 17 anos. 
A segunda memória é do meu único namoro sério que veio logo em seguida, onde com os meus 190 reais de salário eu consegui comprar um coturno de couro de 120 reais de presente de Natal para meu então namorado.
Namorei o Gu dos meus recém completados 17 aos 18 anos, e uma vez ele me disse que me conheceu ainda um menino, e que eu tinha transformado-o num homem. Talvez eu nunca esqueça disso. 

Eu tenho plena consciência de que devo fazer parte de uma geração de mulheres com alguma alteração no DNA. 
A ideia de escrever este texto me veio em uma noite em que eu estava empolgadissima em ir a um Pub daqui de Dublin que transmite os jogos do Corinthians no campeonato brasileiro, chegando lá, me vi sendo praticamente a única mulher ali vestindo uma camisa de futebol e jeans, no meio de tantos vestidinhos lindos usados pelas outras mulheres naquele lugar. Nada contra, quem me conhece sabe que sou apaixonada por vestidos, mas me senti como a Bridget Jones chegando de coelhinha na festa em que ninguém estava fantasiado.



E no Pub eu tomo cerveja vendo o jogo, e não gosto de qualquer cerveja também não, já tive minha época de amar as Weiss, hoje chego nos pubs perguntando o que eles tem de Red Ale para oferecer. 
Aqui em Dublin, os rapazes dizem que é difícil encontrar uma mulher que goste de cerveja, mais ainda uma que goste de Guinness, ué... Não entendo o porque, eu adoro! 
Quando saio com as garotas do café onde trabalho, sou a única pint de cerveja no meio de vários coquetéis.
Não tenho ideia do que tenha dentro de um Cosmopolitan, ou um Sex on The Beach, e pra mim não faz sentido pagar 20, 30 reais (ou 13 euros aqui) em um drink todo misturado com no máximo 200ml se eu posso comprar um litro de cerveja por metade do preço. Sério, não entendo a vantagem. 

Parei de me dedicar a este texto, até que depois de algumas semanas, resolvi ir novamente ao mesmo Pub ver mais um jogo do Corinthians, contra o Flamengo dessa vez, mas naquele dia haviam mais corinthianas vestindo suas camisas! Legal! Não... Tive que ouvir uma delas perguntando quando terminava o jogo e dando incentivos aos jogadores do tipo   "gente, quebra as pernas dele (jogador adversário) logo!"... :s

Parei de me dedicar ao texto de novo (isso acontece muito) e resolvi retomar novamente depois do último show em que fui: Megadeth.
Estava eu, toda apertada na segunda fileira, quando um rapaz que estava atrás de mim tentava a todo custo enfiar uma perna entre mim e a garota que estava do meu lado, nos empurrando a todo o momento... Empurrar a coleguinha pra tentar ficar na grade do show é muito anti-ético... até que nós duas tivemos a mesma ideia, demos os braços formando um cordão e começamos a empurrar o rapaz para trás e darmos pisões no pé dele. Finalmente cheguei na primeira fileira do show já que a moça da minha frente resolveu ir embora, e lá eu estava sendo esmagada e chacoalhando os cabelos alegremente enquanto um cara 4x4 atrás de mim tentava bater cabeça, levei três cabeçadas dele e fiquei meio tonta na primeira. Até que falei para ele se controlar. 
Lembro do show do Foo Fighters que aconteceu aqui na Irlanda também, aquele show para mim era uma questão de honra, tinha muito orgulho ferido que precisava ser posto para fora. Eu sabia que Best of You seria a última música e eu queria muito cantá-la a todos os pulmões, e naquela hora, um grupo de rapazes veio querer abraçar a mim e a menina que estava comigo, dei um jeito de me desvencilhar e curtir meu momento, tomando chuva e berrando como uma doida. A minha amiga acabou ficando com um deles, eu não... mas quem disse que ligo?

Sempre que vou em shows de rock ou em baladas, não me preocupo em parecer atraente, não me preocupo se meu cabelo vai ficar bagunçado. Me arrumo muitíssimo que bem, mas dou mais importância ao momento e aos amigos que estão comigo... não me faz sentido quem vai a um lugar desses e fica num canto, imóvel, sem se divertir, porque o salto vai machucar, porque o batom vai borrar, porque o cabelo vai bagunçar..., fique em casa e nada disso vai acontecer! Ok? Ok!

Quando minha mãe estava grávida do meu irmão, ela queria que nascesse uma menina para que pudesse ajudá-la nos afazeres de casa, alguns anos depois, eu nasci, sem muito talento para estas tarefas, mas sempre disposta a ajudá-la a mover o sofá de lugar. 

Não sou a melhor dona de casa do mundo, mas sou hoje uma mulher de 25 anos que já trabalha há quase 10, sou uma mulher que sabe explicar as regras de um impedimento e que acaba soltando um palavrão na hora do jogo, sou uma mulher que prefere cerveja a drinks cheios de firula, que fica pronta pra sair em 20 minutos, que é competitiva, que acha que não tem necessidade em deixar um cara carregar minha bolsa, sou hoje uma mulher que deu um tapa na cara em um rapaz desconhecido numa balada em Glasgow, por ele ter passado e apertado a minha bunda, sou hoje uma mulher que realizou o maior sonho da sua vida (que não era casar-se de véu e grinalda, era viajar), e realizei sozinha, como minha mãe mesmo me lembrou hoje, contando as moedas do meu cofrinho no chão da minha sala. Mas isso não me faz menos frágil ou me salva de ter meus momentos de carência, não me faz ser menos feminina, modestamente, me maquio e me visto muito bem, obrigada!

Isso não me faz menos romântica ou menos sonhadora, mas eu sei quando é hora de parar de sonhar e acordar para ir trabalhar. 

E posso falar? Tenho muito orgulho de ser do jeito que sou.