segunda-feira, 18 de abril de 2016

O fim do caos.

Depois de vários anos, e noventa e sete lembranças (noventa e oito com esta), eu declaro o fim do caos.
O Caos Primitivo serviu por anos como meu porto seguro, minha válvula de escape, meu amigo, ao qual eu podia contar minhas tristezas e transformar os lamentos em poesia.
Pois bem, este é o motivo. O Caos Primitivo se fez de tristeza, se fez das minhas mágoas, das minhas superações que duravam um dia apenas, das minhas decepções.
Pensei em trocar o fundo negro, mas não adiantaria, o Caos Primitivo já nasceu com o propósito de ser caótico, e hoje eu me vejo em um momento de fugir desse caos.
Assim como tentamos organizar nossa bagunça em caixas, e quanto mais caixas temos, mais espaço temos para criar bagunça, enquanto existir o Caos Primitivo, existirá espaço para que eu possa desabafar minhas tristezas, e enquanto existir espaço, haverá tristeza para ser colocada aqui.
Então neste momento em que busco me proteger e me livrar dos problemas, vejo o fim do Caos Primitivo como uma forma de fazer isso possível.
Espera... eu disse problemas? Quais são de fato os problemas que temos? Hoje um senhor entrou no ônibus pedindo dinheiro para uma instituição de câncer em troca de um salmo da Bíblia,dei o que tinha e repensei minha saúde, meus 25 anos sem uma catapora, um sarampo, uma bronquite, sinusite, rinite, uma caxumba, sem ao menos uma conjuntivite. Minha anemia já não existe mais, e a única coisa que me resta é uma alergia que nem me incomoda.
Meu emprego não é exatamente o que eu procurava, mas me permite pagar algumas contas, dar alguns presentes e manter minhas vaidades. Além disso, por tratar-se de algo que eu nunca fiz, ao menos tenho um desafio e mais habilidades para incluir em meu currículo.
Minha família me ama, apesar dos embates. Minha mãe sempre diz que a gente só briga com quem a gente se importa, e ela tem toda a razão... deixar de se importar com alguém chega até a doer. Minha mãe é uma mulher doce e corajosa, que me passou as melhores qualidades que eu poderia absorver, meu pai é um homem trabalhador e compreensivo, mesmo com a cara de mau, é alguém com quem eu posso conversar. Meu irmão é um dos meus melhores amigos, me entende e tem criado uma habilidade incrível de perceber quando eu não estou bem, mesmo que eu diga que ele está errado. Minhas primas tão diferentes de mim, são mulheres incríveis ao modo delas, e hoje respeitamos nossas diferenças e aprendemos com elas.
Meus amigos são os melhores amigos do mundo! Tão pacientes, tão dispostos, tão amorosos que às vezes eu nem sei se retribuo à altura.
Qual é o problema, então? Não existe problema para fugir. Por que alguém não te deu o devido valor? Bem... se eu consigo reconhecer que não recebi o valor que me era devido, é porque eu tenho consciência do valor que existe em mim.

Mas mesmo assim, o Caos Primitivo precisa chegar ao seu fim, para que eu possa encarar as pequenas adversidades pelo caminho de frente, para que eu não precise me preocupar com quem vai ler minhas intimidades, para que eu não precise mais chorar à frente do computador, para que o meu íntimo possa ser de fato meu. Acho que errei em falar demais, eu sempre tenho essa impressão. E a motivação para escrever aqui, já não é mais a mesma.

Isso tudo que eu escrevo, pode não fazer sentido nenhum à você, mas pra mim faz todo, era algo que eu já vinha pensando há um tempo e se faz necessário. Talvez eu crie outro blog, mais alegre e mais leve, talvez eu resolva manter tudo nos meus cadernos, talvez eu crie outro passatempo e nem tenha tempo mais para desabafar as mágoas no papel. Quem sabe?

Deixo aqui a música que me inspirou a criar o blog, o começo de tudo.

Obrigada!


  

quarta-feira, 23 de março de 2016

De mulher pra mulher.

Mãe, desde que me entendo por gente, te admiro e encho o peito para dizer que vi você trabalhando, fazendo curso técnico e ainda educando seus dois filhos. Você pra mim é um exemplo de mulher, e eu tenho orgulho de ser ao menos 1% do que você é.
Sabe, eu ainda não sou mãe, mas imagino que quando temos um filho, queremos passar o melhor de nós a eles, nossos valores, nossas idéias, nossas opiniões. Mas infelizmente, não podemos fazer com que alguém seja como nós somos, só podemos transmitir o que somos e esperar que nossos filhos aprendam e façam as melhores escolhas de acordo com o ambiente e o momento em que eles vivem.

Mãe, eu imagino que não deva ser fácil criar uma menina, nós somos julgadas pela nossas atitudes, pelo jeito que nos sentamos, pelo jeito que falamos, pela opinião que temos... aliás, parece que em certas horas querem mesmo é que não tenhamos opinião nenhuma, não é?
Mais difícil que criar uma menina, eu imagino que seja difícil criar um casal... digo isso pois em certos momentos foi difícil ser a irmã mais nova de um rapaz, e eu te admiro por ter sido capaz de fazer isso (ao mesmo tempo em que trabalhava e estudava).

Não deve ser simples ver sua menininha tornando-se uma mulher, no mundo em que vivemos. Mas as coisas mudaram muito com o passar dos anos, e neste momento, eu preciso ter voz...

Mãe, calar-se em casa nunca deu nada a ninguém, abaixar a cabeça, menos ainda. Mulheres morreram queimadas para tentar diminuir a jornada de trabalho de 14 para 10 horas diárias, para garantir o direito à licença-maternidade que você teve quando eu nasci. Não podemos retroceder.
Se hoje vivemos momentos de manifestações pelo Brasil, sua avó provavelmente não teve direito a voz no tempo dela, já que as mulheres sequer tinham direito a votar.

Mãe, falando de uma realidade não tão distante, quando meu pai nasceu, mulheres não podiam ter um salário igual ao de um homem para exercer a mesma função, e ainda hoje, sabemos que mesmo após termos igualdade de remuneração aprovada, isso não acontece tão afinco na prática...

Quando meu irmão mais velho nasceu, a mulher pode conquistar seu direito de ir à Lua, mãe... a mulher pode ir à Lua, por que eu não posso ir à rua?
Mãe, eu sempre te admirei por trabalhar, estudar e cuidar dos filhos, só que até 1962, mulheres casadas só podiam trabalhar fora com autorização do marido. Imagina, mãe, você ter que pedir autorização para o meu pai para fazer qualquer coisa? Mulheres foram à luta, e depois de anos conseguiram mudar o Código Civil para ampliar os direitos das mulheres casadas.

Ao passar dos anos, mulheres se tornaram presidentes, atravessaram o deserto, subiram picos, tornaram-se pilotos (melhores que alguns homens) conquistaram o direito de ingressar em cursos de medicina, quantas mulheres você não teve o prazer de conhecer no seu ambiente de trabalho? Conquistamos o aumento da licença paternidade, recentemente. "Conquistamos" sim! Por que um filho é dos dois, e não é uma responsabilidade só nossa. Não é incrível?

Mãe, hoje eu cresci e me tornei uma mulher assim como você, não com todas as suas qualidades, mas com meus próprios gostos, opiniões e valores.
Eu gosto de sair para um barzinho, eu gosto de tomar cerveja com meus amigos, aliás, uma das maiores paixões que eu tenho é provar diferentes cervejas, sabia? De diferentes tipos, de diferentes marcas, de várias partes do mundo. É como fazem com os vinhos, só que é com cerveja.
Mãe, quando eu saio à noite, eu não saio para “caçar”, geralmente vou ao bar de acordo com a atração musical, até porque, mãe, eu não tenho o menor sex appeal quando estou ouvindo uma música que gosto muito, e também não bebo para ficar embriagada, aliás, um dos maiores receios que eu tenho é de chegar alterada em casa, porque te respeito e não quero te ver decepcionada comigo, então eu controlo o meu limite, intercalo com água, me alimento bem... 

Mãe, eu tenho amigos homens, muitos até, e quando eu saio com eles, não quer dizer que vá rolar alguma coisa. Pode ser que aconteça...  mas é na minoria das vezes, e quando acontece, é porque eu quero.

Quando eu estiver namorando, mãe... pode ser que eu queira ir passar um fim de semana na praia, como meu irmão faz, e é simplesmente porque eu quero ir à praia com uma boa companhia, você pode imaginar que estejamos fazendo o kama sutra, quando na verdade poderemos estar jogando um jogo de tabuleiro antes de dormir, ou assistindo TV, ou fazendo qualquer coisa normal que fazemos com alguém que gostamos. Aprendi com meu primeiro namoro, que um namorado deve ser, antes de tudo, um amigo, alguém com quem eu possa conversar sobre as coisas e me divertir, sem precisar estar "namorando" de fato todo o tempo em que estivermos juntos. Mãe, nada aconteceria sem a minha permissão, e se ele tentasse algo mesmo sem a minha vontade, a gente poderia denunciá-lo, porque trataria-se de um estupro, claro que eu não quero um homem que não me respeite ao meu lado, pois você me ensinou isso.

Muitas vezes, quando eu saio com amigos, se chego em casa mais tarde do trabalho, você me recebe com uma cara fechada, como se eu estivesse errada por me divertir. Lembro das vezes que você não me deixava dormir durante o dia quando eu chegava de manhã, por que essa punição? O que foi que eu fiz de errado?
Mãe, se meu irmão trabalha, eu também trabalho e compro minhas coisas com meu dinheiro, você sabe o quanto eu sempre trabalhei e continuo, porque então não poderia me divertir? Eu me estresso igualmente e também preciso extravasar... 

Se meu irmão tem “necessidades”, eu também tenho! Tenho hormônios e, como você sabe muito bem, eles dançam pelo corpo e nos fazem atingir uns picos súbitos e insaciáveis. Somos anatomicamente diferentes, mas somos feitos da mesma matéria. Mas eu me controlo, porque como eu disse, não quero qualquer homem ao meu lado. 

Mãe, não pense que eu sou uma rebelde. Se eu me depilo de determinada forma, isso não influencia os meus valores, é simplesmente porque eu me sinto melhor assim. Se eu compro determinado tipo de calcinha, não quer dizer que eu seja indecente, pode ser porque o preço se encaixava no meu bolso, porque quis comprar um sutiã e obrigatoriamente tive que comprar o conjunto, porque simplesmente achei bonita, ou seja lá qual for o motivo, mas você não pode me julgar por isso, ninguém pode. Assim como a roupa que eu visto nada quer dizer sobre o meu caráter, visto simplesmente porque me senti bem nela. Para ser sincera, mãe... me visto mais para ter a sua aprovação enquanto passo pela sala, do que para me sentir bem de verdade quando saio de casa... 

Eu te amo e te respeito, você me ensinou todos os seus valores e o que aprendeu com a vida, eu quero continuar aprendendo com você, mas também quero te mostrar como o mundo funciona agora, que nós mulheres podemos ser muito mais livres, que temos cada vez mais poder para bater de frente com qualquer pessoa que queira nos julgar por nossos atos, jeitos, gostos, opiniões, etc, podemos ser o que quisermos hoje, astronautas, motoristas de caminhão, policiais, lutadoras de boxe... o céu é o limite! Até a Barbie tem mudado e mostrado que as mulheres podem ser como elas quiserem, que não precisamos seguir padrão nenhum. Eu fico triste por não ser exatamente a mesma coisa como foi nos seus vinte e cinco anos, mas gostaria que você ficasse feliz por as coisas estarem mudando e evoluindo, e você ainda pode provar dos benefícios dessa mudança! Mãe, não estou dizendo que o seu tempo era outro, mas que as mudanças tem acontecido cada vez mais rápido, o mundo muda a todo instante. 



Eu sei, mãe, que o mundo não é um lugar seguro, que não podemos confiar em qualquer um, você me ensinou tudo isso e sempre buscou trazer os exemplos que você via por aí. Só que nós mulheres nascemos com um sexto sentido incrível a ponto de sentir os caminhos ou as companhias que devemos evitar, isso é natural nosso e é nosso maior escudo.

Mãe, pode ser que um dia eu seja uma mãe, e o mundo da minha filha será diferente do meu. O mundo da minha prima mais nova já é diferente do meu, e às vezes eu entro em choque com o universo dela, mas sei que ela está se tornando uma mulher tão incrível (o que não pode ser diferente, vindo de uma família como a nossa), que eu sinto que ela certamente sabe o que está fazendo.  

Eu espero que minha filha possa aprender com os meus valores e absorver o melhor deles, espero também que ela possa formar o caráter dela aprendendo com o erro dos outros e com as coisas que ela irá observar na rua, como eu venho fazendo; espero que ela possa viver da melhor forma possível, sendo a mulher que ela vir a se tornar, e que eu possa dar asas a ela, quando chegar a hora.


Mãe, eu não quero te atacar com esse texto, eu quero te agradecer por ter feito eu me tornar a mulher que eu sou, minha determinação, minha independência, meu jeito de bater o pé enquanto eu não conseguir as coisas do jeito que quero, vem de você, minha generosidade e meu amor ao próximo, vem de você. Hoje eu criei o meu caráter, a minha personalidade, os meus valores, a minha própria opinião, graças à educação e o exemplo que você me deu, e isso jamais mudará, independente do que eu faço no meu cabelo, da hora em que eu volto para casa, do que eu bebo na rua ou do que eu visto. Eu não quero ser igual ao meu irmão, eu só quero poder ter o direito de ser eu mesma, e não ser reprimida. Já passei por alguns apuros, mas eu soube passar por cima, pois eu tive consciência do que estava fazendo, e eu aprendi com todos eles, eu gostaria de dividí-los com você, mas quero que você possa me ouvir sem me julgar. Eu só quero que você confie em mim, que se preocupe mais com as coisas que te fazem bem, e entenda que eu jamais faria algo para desapontar você, ou algo que fosse contra os meus princípios, pois tudo o que eu quero é te ver feliz, como todas nós devemos ser. Eu mereço e você também!


quinta-feira, 17 de março de 2016

Florença

Resolvi ir à Florença porque aprendi no meu antigo emprego que ir à Itália e não fazer o trio Roma-Florença-Veneza, era pecado. Nem sabia ao certo o que existia lá para ver, provavelmente este era um daqueles destinos em que eu usava o discurso pronto “Caminhe por suas belas ruas e visite um ou dois museus”.

Florença foi um perrengue mesmo antes de eu chegar e continuou sendo até eu ir embora. Mas talvez tivesse sido um perrengue necessário.
Já começamos no trem partindo de Roma, dividi uma cabine-leito com 3 italianos, me esforçando para entender o que eles conversavam. E era a única forma de distração, já que foi o meu primeiro trecho sem wifi, sem uma tomada e com um livro que eu simplesmente não conseguia ler de forma alguma.
Não passei por nenhum “pânico por ser uma mulher e viajar sozinha” até tomar o trem Roma-Florença quando, na hora de dormir, um dos italianos que estava na minha diagonal ficava fazendo uns movimentos estranhos, enquanto deitado de bruços. A princípio, na minha inocência, imaginei que ele estivesse se ajeitando para dormir, até que realizei que ninguém se ajeita por mais de 10 minutos...

Florença, com seu ar medieval, não foi abençoada pela tecnologia do metrô ou do tram... mas tem ruas lindíssimas onde os carros pouco se atrevem a passar e as pessoas caminham admirando as casinhas que parecem terem saído de filmes. E foram por estas ruas que nós andamos... por 3 kilômetros e meio para chegar ao Hostel. Andamos.... eu, minha mochila nas costas, minha bolsa a tira colo, minha mala de mão pendurada no braço, minha mala vermelha de 23kg e mais outra bolsa apoiada na mala. Andamos até que a uns 200 metros do hostel, ao atravessar a rua, minha mala de 23kg resolveu ficar no chão enquanto a alça ficou na minha mão...
Florença me reservou o pior hostel de toda a trip, onde eu sequer pude levar minhas malas ao quarto pelos seus 3 lances de escadas estreitas (A tecnologia do elevador também parece não ter chego por lá). Florença me reservou o dia mais gelado até então, gelado demais para que a bateria do meu telefone aguentasse por mais de duas horas. Florença me reservou as entradas mais caras (as quais eu preferi não pagar).


Florença foi linda, desde o carrossel que me recebeu no meio da cidade medieval, até ao seu ar de cidadezinha do interior de Minas (mesmo sem eu nunca ter ido ao interior de Minas), passando pelo prazer do sabor dos gelattos (poderia viver disso), pela loucura do Mercado Central e a beleza fora do comum da Santa Maria del Fiore (entre os lugares mais bonitos que eu vi em toda a minha aventura).  Florença me deu um enorme poder de liberdade em poder substituir a Galleria Dell’Accademia e a Galleria degli Uffizi por alguns itens de maquiagem da Kiko, afinal de contas, a viagem é toda minha e eu posso fazê-la como desejar; depois de passar uma tarde inteira no Louvre e mais outra no Museu do Vaticano, eu já estava bem satisfeita de obras de arte. Florença foi tão linda, que eu nem me importava mais com os perrengues até então.



Mas Florença me tocou mesmo de outra forma, me fez ter consciência de uma parte de mim que eu não valorizava como deveria.

Meu trem para Veneza sairia à 01h30 da manhã, e assim como eu e as amadas malas andamos mais de 3km para chegar ao hostel, precisamos fazer o mesmo caminho de volta, dessa vez com uma mala quebrada. A manta que eu usava para amarrar as alças da minha mochila no meu corpo, tive que usar para tentar uma gambiarra na minha mala.

Eu e as amadas malas saímos do hostel pouco antes da meia noite, e entre as pessoas que iam ou voltavam dos bares estava eu, andando a 1km por hora, quase carregando a mala de 23kg na mão para que a alça não escapasse novamente, e agora com o incômodo da minha mochila escorregando dos meus ombros a todo instante já que eu não tinha mais com o que amarrá-la em mim. Você pode me perguntar o porque eu não comprei outra mala, pois eu te digo que o valor de uma mala nova era o valor que eu tinha para gastar por dia durante todo o resto da trip.
Andava por 2 minutos, parava, respirava, tentava de novo, quando a alça da minha mala ameaçava escapar, parava novamente, respirava, tentava de novo. Cogitei desrespeitar as leis do mochileiro e pegar um taxi, mas na parte medieval de Florença, logicamente não passava nenhum. E foi a primeira vez durante toda a trip que eu chorei de nervoso/raiva/desespero.

Mas sabe...?

Não durou tanto.

Quando olhei o relógio e o mapa, vi que faltava apenas 1 dos 3km do percurso, e que não tinha andado tão devagar assim, apesar das inúmeras paradas, então engoli o choro e continuei.

Durante aquele km restante, o pensamento foi de que aquela situação não era para qualquer pessoa. Não era para qualquer mulher carregar tanto peso, sozinha por uma madrugada de 3 graus. E por um momento eu lembrei de diversas vezes em que eu me rebaixei a situações que eu não merecia passar, que eu aceitei menos que eu valia, que eu me impus menos que eu podia. E concluí que eu não merecia nada daquilo.


Realizei então de que realmente aquela situação não era para qualquer pessoa, porque de fato eu não sou uma pessoa qualquer, e que se alguém quisesse andar comigo, teria que ser muito mais que qualquer pessoa. 


sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

O amor cansa.

Das grandes dúvidas da humanidade, existe uma cuja resposta ainda não foi encontrada. Se o amor é realmente eterno e todas as pessoas que passaram por nós foram apenas breves paixões ou se o amor acaba e recomeça (e acaba de novo).

Já pensei de várias formas mas continuo sem resposta.

Só sei que o amor cansa.

O amor cansa de mentiras, e cansa em dobro das desculpas esfarrapadas em tentativa de escondê-las.
O amor cansa de buscar por atenção, o amor cansa das mensagens visualizadas e não respondidas.
O amor cansa de não saber no que acreditar, o amor cansa até mesmo de se cansar.
E quando cansa, o amor cansa ainda mais de receber uma dose de esperança e ver que na verdade nada vai mudar muito, e cansa de se ver cansado novamente, ainda mais que antes.
O amor cansa até depois que o outro vai embora e diz todas as coisas que gostaria de ter feito, quando o nosso amor já estava cansado de esperar por isso.
O amor cansa de se doar e não receber. Não se trata de um jogo de retribuições, mas o amor precisa ser regado para florescer.

O amor cansa de perguntar e não ser respondido, de ser desconversado, de ser esquecido.
O amor cansa quando chora mais que sorri.

O amor cansa de ser amor e não receber amor.



segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

De 2011.

Não sei ao certo o que acontecia, o que ela tinha que atraía homens impossíveis. E o pior, o que a atraia neles?
A verdade precisava ser dita... eles a atraiam... seria uma espécie de fetiche? De vício? De droga? Não sei... mas fazia com que a adrenalina dobrasse... com que a cabeça fosse às nuvens... com que o corpo arrepiasse...
Tinha sabor de pecado, aroma de mistério e textura de desejo.
O suor escorria por dentro do corpo, os pensamentos eram escondidos, só dela, como um segredo. Era como arte, mágica, música, poesia...
Se sentia errada, se sentia certa, justa e injusta.
Se sentia na divisa entre o céu e o inferno... Se fosse ao inferno, teria desejo, sorriso de canto de boca, carne, fogo, mistérios e resistências...
Se fosse ao céu, teria que apostar na incerteza, mas se tudo desse certo, teria nuvens, sorrisos de orelha a orelha, alma, pureza e mais reticências...
Como é possível ter alguém e ao mesmo tempo não ter ninguém? Querer alguém e não querer ninguém? De que adiantava tanta gente ao redor se ela se sentia sozinha e calada?

Update: Já fiz a minha escolha.

"Vida consumindo vidas para continuar vivendo.
Acaba para um, continua para todos.
A cobra come sua cauda.
O ciclo reinicia..."

Personagens novos, com os mesmos problemas de sempre. Hasta quando?


quarta-feira, 18 de novembro de 2015

A mulher que me tornei.

Tenho duas lembranças da minha adolescência que me marcam muito, a primeira é de quando eu tinha 16 anos e consegui meu primeiro emprego, ganhava um salário de 170 reais, mas ganhei um aumento e passei a ganhar 190!
Nessa época eu tive um namoradinho na porta da escola, que hoje é meu grande amigo, ele já tinha terminado o ensino médio e um dia eu perguntei se ele não queria fazer nada, um curso, uma faculdade, procurar um trabalho, sei lá, por que na minha cabeça sempre tive muito claro o que queria cursar e fazer da vida. Ele não sabia direto, pensava em fazer um curso de desenho mas não passava muita segurança não, então eu resolvi terminar pq "não queria um cara que não ia fazer nada da vida", eu estava cobrando isso de um cara de 17 anos. 
A segunda memória é do meu único namoro sério que veio logo em seguida, onde com os meus 190 reais de salário eu consegui comprar um coturno de couro de 120 reais de presente de Natal para meu então namorado.
Namorei o Gu dos meus recém completados 17 aos 18 anos, e uma vez ele me disse que me conheceu ainda um menino, e que eu tinha transformado-o num homem. Talvez eu nunca esqueça disso. 

Eu tenho plena consciência de que devo fazer parte de uma geração de mulheres com alguma alteração no DNA. 
A ideia de escrever este texto me veio em uma noite em que eu estava empolgadissima em ir a um Pub daqui de Dublin que transmite os jogos do Corinthians no campeonato brasileiro, chegando lá, me vi sendo praticamente a única mulher ali vestindo uma camisa de futebol e jeans, no meio de tantos vestidinhos lindos usados pelas outras mulheres naquele lugar. Nada contra, quem me conhece sabe que sou apaixonada por vestidos, mas me senti como a Bridget Jones chegando de coelhinha na festa em que ninguém estava fantasiado.



E no Pub eu tomo cerveja vendo o jogo, e não gosto de qualquer cerveja também não, já tive minha época de amar as Weiss, hoje chego nos pubs perguntando o que eles tem de Red Ale para oferecer. 
Aqui em Dublin, os rapazes dizem que é difícil encontrar uma mulher que goste de cerveja, mais ainda uma que goste de Guinness, ué... Não entendo o porque, eu adoro! 
Quando saio com as garotas do café onde trabalho, sou a única pint de cerveja no meio de vários coquetéis.
Não tenho ideia do que tenha dentro de um Cosmopolitan, ou um Sex on The Beach, e pra mim não faz sentido pagar 20, 30 reais (ou 13 euros aqui) em um drink todo misturado com no máximo 200ml se eu posso comprar um litro de cerveja por metade do preço. Sério, não entendo a vantagem. 

Parei de me dedicar a este texto, até que depois de algumas semanas, resolvi ir novamente ao mesmo Pub ver mais um jogo do Corinthians, contra o Flamengo dessa vez, mas naquele dia haviam mais corinthianas vestindo suas camisas! Legal! Não... Tive que ouvir uma delas perguntando quando terminava o jogo e dando incentivos aos jogadores do tipo   "gente, quebra as pernas dele (jogador adversário) logo!"... :s

Parei de me dedicar ao texto de novo (isso acontece muito) e resolvi retomar novamente depois do último show em que fui: Megadeth.
Estava eu, toda apertada na segunda fileira, quando um rapaz que estava atrás de mim tentava a todo custo enfiar uma perna entre mim e a garota que estava do meu lado, nos empurrando a todo o momento... Empurrar a coleguinha pra tentar ficar na grade do show é muito anti-ético... até que nós duas tivemos a mesma ideia, demos os braços formando um cordão e começamos a empurrar o rapaz para trás e darmos pisões no pé dele. Finalmente cheguei na primeira fileira do show já que a moça da minha frente resolveu ir embora, e lá eu estava sendo esmagada e chacoalhando os cabelos alegremente enquanto um cara 4x4 atrás de mim tentava bater cabeça, levei três cabeçadas dele e fiquei meio tonta na primeira. Até que falei para ele se controlar. 
Lembro do show do Foo Fighters que aconteceu aqui na Irlanda também, aquele show para mim era uma questão de honra, tinha muito orgulho ferido que precisava ser posto para fora. Eu sabia que Best of You seria a última música e eu queria muito cantá-la a todos os pulmões, e naquela hora, um grupo de rapazes veio querer abraçar a mim e a menina que estava comigo, dei um jeito de me desvencilhar e curtir meu momento, tomando chuva e berrando como uma doida. A minha amiga acabou ficando com um deles, eu não... mas quem disse que ligo?

Sempre que vou em shows de rock ou em baladas, não me preocupo em parecer atraente, não me preocupo se meu cabelo vai ficar bagunçado. Me arrumo muitíssimo que bem, mas dou mais importância ao momento e aos amigos que estão comigo... não me faz sentido quem vai a um lugar desses e fica num canto, imóvel, sem se divertir, porque o salto vai machucar, porque o batom vai borrar, porque o cabelo vai bagunçar..., fique em casa e nada disso vai acontecer! Ok? Ok!

Quando minha mãe estava grávida do meu irmão, ela queria que nascesse uma menina para que pudesse ajudá-la nos afazeres de casa, alguns anos depois, eu nasci, sem muito talento para estas tarefas, mas sempre disposta a ajudá-la a mover o sofá de lugar. 

Não sou a melhor dona de casa do mundo, mas sou hoje uma mulher de 25 anos que já trabalha há quase 10, sou uma mulher que sabe explicar as regras de um impedimento e que acaba soltando um palavrão na hora do jogo, sou uma mulher que prefere cerveja a drinks cheios de firula, que fica pronta pra sair em 20 minutos, que é competitiva, que acha que não tem necessidade em deixar um cara carregar minha bolsa, sou hoje uma mulher que deu um tapa na cara em um rapaz desconhecido numa balada em Glasgow, por ele ter passado e apertado a minha bunda, sou hoje uma mulher que realizou o maior sonho da sua vida (que não era casar-se de véu e grinalda, era viajar), e realizei sozinha, como minha mãe mesmo me lembrou hoje, contando as moedas do meu cofrinho no chão da minha sala. Mas isso não me faz menos frágil ou me salva de ter meus momentos de carência, não me faz ser menos feminina, modestamente, me maquio e me visto muito bem, obrigada!

Isso não me faz menos romântica ou menos sonhadora, mas eu sei quando é hora de parar de sonhar e acordar para ir trabalhar. 

E posso falar? Tenho muito orgulho de ser do jeito que sou.


sexta-feira, 30 de outubro de 2015

A Lua

Tenho um relacionamento sério com as coisas que vem do céu.
Considero que ver o amanhecer é um presente, é para abençoar o dia que começou tão cedo ou para coroar uma noite que ainda não acabou.
O por-do-sol é caso antigo, por ele sou apaixonada, paro o que estiver fazendo para apreciá-lo é recuperar as energias de um dia corrido.
Agora, quem mexe com a minha cabeça mesmo,e deixa louca, fascinada, é a Lua. 
A Lua enche-se, fica imponente, brilhante, apaixonante, faz as pessoas olharem para o céu e encantarem-se com ela, é motivo de canções de amor, de poesia. 
Até que de repente, mingua-se, começa a perder levemente o brilho, a esconder-se no céu aos pouquinhos, e ninguém consegue dar mais muita atenção à minguante Lua...

"Você não sabe o que tem
Até que o amor tenha quase se esgotadoDesta vez ela está desistindo"
Até que ela finalmente resolve sumir, mostra sua face escura, não iluminada, para a Terra, transforma-se numa Nova Lua, preparando-se para crescer de novo enquanto ninguém a procura no céu.
"Eu deveria ter previsto issoAgora é tarde demais para acordarA mente dela está feita,eu sei, o sonho acabou.""Eu estava cego demais para notá-laEnvolvido comigo mesmoTrabalhando demais, noite e diaPensei que estávamos tão segurosNão posso imaginar que outro alguémPoderia vir entre nósE levá-la emboraA mente dela está feita,eu sei o sonho acabou."
Então, depois de se esconder e renovar-se em conjuntura ao Sol, a Lua volta a crescer, timidamente, aumentando de tamanho aos poucos e fazendo os seus amantes começarem a levantar seus olhos para o céu novamente. E então, um dia, ao andar pela rua, nós deparamos com ela ali no céu, cheia novamente, brilhante e imponente, e parece que a noite fica mais bonita refletindo o brilho dela.
"Mas meu coração simplesmente não desiste fácilEla é boa demais para ser esquecidaBoa demais pra ser de verdadeAntes que meu mundo seja destruído,A ela eu prometerei a Lua.

E sempre que ela me esperouEu nunca disse: "Eu te amo"Mas mantive isto dentro de minha almaE a todo tempo fui um tolo."

E no fim das contas, a Lua sou eu, a Lya é você, a Lua somos todas nós... Brilhando, encolhendo, sumindo, renovando, crescendo, brilhando, chamando a atenção, cheia de fases, cheia de momentos que só um amante de verdade consegue entender e mesmo assim continuar apaixonado.